23.11.10

história das viagens posses horizontes

Os barcos somem no horizonte e foi assim que os primeiros gregos intuíram que o planeta era redondo.

15.11.10

novembro

a viagem morreu.
estertorava no trem, veio um vigia e perguntou
o que tinha se precisava de ajuda. orgulhosa,
ela foi ao banheiro e se deixou ficar.
se ninguém se der conta, e se o trem for
dragao, a viagem clandestina e ignorante vai
sem trilhos nuvens por aí, perdido o passaporte

a família chorando no jornal nacional
com foto e violinos
diz "ela sumiu no universo"
as maes do mundo deveriam aprender que o universo
é negro e draga toda luz, é túnel e leva
toda luz pra olhos que ninguém aqui conhece

tenho medo dos olhos que veem. arrumo o pinto
na calça e enrubesço. mas pra falar da viagem
melhor em terceira pessoa: que ela tomou muito calmante
e está dormindo até agora. a viagem no rehab,
que a viagem anda em voltas sem dar conta.

#

2010 está acabando. logo mais, o obituário do ano findo. mas agora ele està vivo, igual a gente.

11.11.10

do ofício. ouro de tolo

depois de ler: http://limasdapersia.blogspot.com/2010/11/massa-sebenta.html

pensando:

que as trincheiras têm que ser descobertas - ou inventadas? - e, antes, ¿as trincheiras sao necessárias?

estou terminando um livro de contos. faz meses que estou terminando, e só topei com a vida fazer esse livro quando decidi que nao tinha pressa, que nao tinha necessidade, que nao tinha urgência pra além da necessidade de fazer moverem-se as placas tectônicas das gentes, eu incluso, todas nós.

quero dizer, o meu chao é a gente.

de "a gente" tenho tentado excluir as vontades de fama e de dinheiro e de autossatisfacao que sao automáticas no imaginário do artista. vai epígrafe do raul seixas nesta vida

Eu devia estar sorrindo
E orgulhoso
Por ter finalmente vencido na vida
Mas eu acho isso uma grande piada
E um tanto quanto perigosa...


.

o próximo passo, quando terminar o livro que já está terminando, nao sei qual vai ser. penso em mandar pra editoras a ver qué onda, mas eu desgosto tanto do que vem sendo publicado e tido sucesso que nem imagino o que poderá acontecer e qual vai ser a minha reacao com o que acontecer.

também nao quero ser mulher desprezada e raivosa e admito que quem faz as editoras e as livrarias é tudo gente, também. eu trabalhei um tempo como vendedor de livros. e as pessoas sao ao mesmo tempo predadoras capitalistas e massa mole & afetuosa, quer dizer, eu me confundo muito. no que diz respeito ao dinheiro. tudo que passa pelo dinheiro.

porque a escrita é um lance que mastiga e arrota e deglute e estraga o dinheiro. o resto é tino comercial e gosto dos banqueiros.

porque mesmo inventar outras formas de livro - estou fazendo até curso de encadernacao - sempre passa pelo dinheiro. ou nao?





(...)

(tem também outra coisa, que eu fui educado em igreja evangélica lendo a bíblia feito gibi, e jesus cristo diz "onde estiverem mais de duas pessoas reunidas em meu nome, ali eu estarei também". como fundamentalismo cristao a gente vê a merda que isso fez, mas se deslocar essa lógica para a experiência de leitura, nao sei, a mim parece forte e um pouco verdadeiro)

10.11.10

a insônia

eu nao conseguia dormir e era de ansiedade - hoje eu durmo muito bem - mas tem que ser de noite e após o dia - cochilar assim como quem nao tem pressa, nao consigo - tenho um amigo que dorme tudo o que pode, e é bastante - e uma professora escreveu um texto contando a insonia da clarice lispector e do virgílio piñera - a insonia é um negócio muito persistente, etc. -

outro dia cantavam: que a solidao é um negócio esquisito, tanta gente tao sozinha, se os sozinhos se juntassem a solidao é que ficava sozinha

hoje eu consigo dormir. nao quero uma vida insone. a vida é sonho. menos quando a gente nao dorme. descoberta da língua castelhana. que a frase do goya, el sueño de la razón cria mosntruos, nao lembro se é crear ou criar, têm acepçoes diferentes, mas sueño significa tanto sono quanto sonho

de criar e crear, um é pra filhos e açudes, outro pra histórias.

a tarefa mais difícil, eu sempre achei: se me pedia "conta uma história" para dormir. mas pedia com tanta veemência, e necessidade, que eu contei sem saber o que contava. e depois nao consegui dormir e fiquei ouvindo os roncos.

8.11.10

notas pro meio do caminho

a natureza nao precisa ser escrita

os passarinhos cachorros mesmo a gente os nossos órgaos e as veias nada disso pede escrita

ou entao tudo escrita de deus javé, cada coisa é uma letra e a sintaxe paira sobre as águas

deixei de tentar escrever a história das pessoas e tenho me dedicado às placas tectônicas e â vida dos animais extintos. agora penso em voltar â gente, mas ainda nao tive sucesso.

como a história das grandes navegacoes e das terríveis ditaduras.

ou entao eu devia escrever mais particularidades, a história da menina gorda, estou de saco cheio das meninas gordas.

acabo de ver um filme muito ruim sobre uma menina gorda.

5.11.10

a vida te deu algo que você nao sabe: recebe
as maos abertas e medrosas, é uma coisa fresca
e morna

você, essa coisa, carrega para longe de casa
passeasse no parque os periquitos que lá estao

a coisa é um periquito / sem gaiola
e a vida também te deu uma gaiola

1.11.10

história do paraguai

os homens no paraguai têm horror a feijao
porque dos quinze aos dezoito iam ao servico militar
voluntariamente, caso contrário eram raptados pelo estado,
e a única coisa que tinham para comer era feijao
uma das comidas mais comuns no país
adultos, se veem vomitam.
toca às mulheres cozinhar, comer
os cereais e a pátria defendida