30.8.10

o crime da mala

a mulher picotada escapa
um bolso furado
polícias sargentos a igreja
e todos os jornais vêm acudir
eu não posso te levar comigo
nem te despachar pra bahia
de todos os santos
te deixo na estante, com sobrevida
no que deveria ser a minha alegria
virou essa coisa empoeirada
tiro a poeira
você fica lá
espanado

depois de amanhã eu vou viajar
o avião vai cair e você nunca mais vai me ver
vai chorar lágrimas de sangue
tanto amor a gente tinha pra viver

é nada.
eu vou chegar lá longe.
você vai ficar agarrado no meu ombro
feito encosto
até eu arranjar outro.
esse outro não vai ter poeira: delícias
mucosas presentes de grego, deus
grego

lembrei agora dos poemas do kaváfis
com os meninos de esguelha
e os velhos perfeitos que cambaleiam

eu não posso te levar comigo
nem te despachar
nem com pinga

acho que preciso aprender a conviver
com você sem você
mas isso é viagem minha.
o tempo cura todas as feridas
só não faz milagres.
os pedacinhos de mulher
que te digam.

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