não tenho mais o que escrever sobre as órbitas e os vulcões. a não ser que continuamos orbitando / e correndo o risco da erupção. de dentro do apartamento, tudo isso parece bastante improvável. a cada cinco minutos, um helicóptero movimenta o horizonte de são paulo.
preciso criar novas histórias de catástrofe. começo assim: sem aviso, um dia, fugiram todas as aves. o deus da ira criou um corredor de nuvem e sementes entre o vácuo do universo e levou de volta os inocentezinhos ao primeiro éden, alados. morcegos, insetos. os aviões que tentavam entrar no túnel eram esmagados pela pressão divina.
é uma desgraça que seja esse o deus verdadeiro, alguém disse.
mas era. ninguém contorna as desgraças.
a grande catástrofe são os céus limpos. nenhum avião decolava, os helicópteros caíram. ficamos assim por muitos e muitos e muitos anos. eu morri (tive uma vida linda, obrigado) e meus filhos e meus netos, a quinta e trigésima gerações. deus apagou os registros das asas, pterodáctilos se esfarelaram nos museus, nenhuma ilustração. quando alguém, de memória incauta, tentava dizer "que se voa" sua língua se transformava em cinzas, ele era levado com sua casa para os pés da colina e soterrado em pedras, assim ordenou o senhor teu deus.
"é uma desgraça que seja esse o deus verdadeiro", alguém continuava dizendo.
dizer isso era permitido. já que não se podia fazer nada.
mas, como dizem, nenhum pássaro cai do céu sem que deus assim queira. e ele tinha um plano. passados duzentos, trezentos anos, os anjos do Senhor desceram dos céus com suas trombetas, causando espanto maravilha e desespero em quem não sabia mais do que a vida rasteira. trouxeram ouro, mirra e incenso / e toda a gente assomou à praça, como se fosse inevitável.
(eu ensaio agora um amor. evitam tanto o amor. os anjos de deus nem se dão ao trabalho. nas cobertas, neste quarto, meu amor não vamos à praça. teus cílios parecem asas)
um a um, a lâmina sagrada cortava o pescoço a toda a gente. eram anjos terríveis, suas caras de espelho não conheciam piedade. oceanos vermelhos sobre a terra.
em recompensa, o deus da guerra legou o planeta aos anjos justiceiros. e trouxe de volta as galinhas, as libélulas, escuros morcegos. no oitavo dia, criou deus o avião e viu que era bom. finda toda a criação, despiu os anjos de suas asas e jogou-as no magma. hosana, hosana. e deus se aposentou.
16.6.11
Assinar:
Postar comentários (Atom)
no seu texto venta como no miradouro que eu estava vendo as ondas do tejo - coisas que se fazem com o vento sem voar - bonito meus olhos ficaram indo. - no mais, você não vai gostar, mas vejo algo do h. helder na crueldade, divina.
ResponderExcluirah, eu gosto da crueldade, divina. o h. helder é meu irmão :)
ResponderExcluir