28.12.10

nem sombra de amor

a expressão é a hilda hilst quem cita, fala de uma santa, que disse que viu deus e que ali não havia nem sombra de amor.

muito do que eu escrevo é só pela alegria das palavras, os sons juntos, às vezes divertido dizer em voz alta. é, acho que é isso mesmo. difícil ter uma verdade prévia, na maioria das vezes, mesmo se escrevo histórias, a história aparece desse acaso lexical.

por exemplo, eu ando bem metido e achando que aos 26 anos de idade já escrevi algumas pérolas da língua portuguesa e se morresse já tinha feito a minha parte, mas uma dos textos mais legais que eu escrevi, que eu considero, saiu de um título que às vezes eu ando na rua repetindo, de tão bonito me parece -

flan náufrago

- as palavras assim, que nem brinquedos.

nisso, no trato com as gentes, corro o risco e tenho medo, até, de uma inconsequência muito grande. de tipo assim sair falando e escrevendo igual a criança que com um pedaço de pau machuca os testículos do cachorro. pode ser besteira esse medo, ou até uma prova da minha irrelevância tão mesquinha, mas não vou mentir, eu tenho muitos medos e um deles é esse.

outro, que é o mesmo, seria o de machucar meus próprios testículos. pois já que as palavras não têm verdade, a materialidade delas, uma vez confrontada, pode me deixar vazio de pontes, pior.

me espanto com frequência que, por exemplo, pensar de repente "nem sombra de amor" é um brinquedo, mas que logo em seguida isso ressoa, mancha as paredes, somos caverna e eco, paráfrase do fernando pessoa, e o dia vai passando e pode ficar mais escuro, ou mais claro, a depender do que fazemos com o acaso

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