14.8.12

Hagiografia de Simone Weil

diz que Simone Weil, que no frio inverno da França largou a vida de intelectual universitária para trabalhar como operária nas fábricas, e magra doente com a mão atrofiada deixava de comer e não tinha calefação interna no pequeno quarto que alugava, passava frio e mal tinha par de meias, inalando diariamente as fuligens e os desmandos e enfrentando as máquinas quentes e o vento gelado da rotina de trabalhadora,

ela, que poderia ter uma vida mais confortável - embora fosse a década de 1930 e os nazistas logo invadissem a França, forçando sua família e seus conhecidos a migrarem a outros lugares, ou encerrando-os em campos de concentração de onde  poucos sairiam vivos, exterminados por aqueles que só queriam o bem de todos, quanto tempo você acha que dura o seu conforto? -

ela, que por piedade e profunda comunhão com tudo o que é humano e sofre, e que teve vida exemplar de santa desde criança, quando sua mãe a tirou do banho numa noite fria da França e ela, tremendo de frio, dirigiu-se a si mesma, três anos de idade, e disse ao seu próprio corpo, ela que era força: "Tremes, carcaça?", e depois, mais velha, moribunda num hospital inglês, recusaria qualquer comida e qualquer tratamento porque a maior parte da população humana tem fome, não tem o que comer, e são todos iguais eu, iguais você, só que diferentes porque não têm o que comer, e que nos lembra em certo momento, em um de seus textos, que a maior parte da humanidade nunca sequer chegou perto de um banho quente

Diz que Simone Weil, um dia, ao conversar com seus companheiros de fábrica (ela que vivia sem calefação e sem meias, como já explicado, e era inverno, nevava na França), espantou-se ao saber que eles, com o mesmo salário, viviam menor privação que ela, porque não a buscavam

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