20.1.11

estou escrevendo a história de uma pessoa que não tem braço.

não, assim: a pessoa tem braço, mas esquece como usá-lo.

fico pensando que é muito trágico a pessoa não perceber mais o óbvio das coisas, o automático, somos muito automáticos.

não consigo escrever a história porque, para escrever, uso meus braços. e a história é inspirada em mim. nas vezes em que eu não sei mais o que é ter um braço.

tento me proteger na história.

será um fracasso absoluto se, em vez de viver o escritor, eu começar a viver o personagem. será um erro de cálculo. será um planejamento muito falho. me parece impossível que eu planeje tão falhamente assim.

mas olho meu braço e penso: o impossível será impossível?

penso: ninguém vai me salvar. e: eu [sozinho].

no dia a dia, esqueço como ter muitas coisas. isso aqui é só uma história. olho a parede. o problema é que às vezes eu não consigo pensar: parede. eu retrocedo para o fragmentado da parede.

percebo que a gente só sobrevive no atomizado.

palpito que qualquer desvio é muitíssimo perigoso. eu quase tenho medo. mas tenho uma certeza de razão muito grande.

o problema é se essa certeza de razão já for indício de a pessoa estar variando das ideias.

o braço só vai ser um problema depois que eu parar de escrever. enquanto escrevo, é porque o braço ainda existe. em mim.

e as palavras. denota que eu tenho um pressuposto. o pressuposto não oferece perigo.

isso aqui é o ensaio de uma história. estou escrevendo um romance e vou ser um grande escritor. ai meu braço. MEU BRAÇO. quando eu precisar saber usá-lo, aí será problema.

será que eu já morri?

Um comentário:

  1. Marcos! quantos textos já podei lá na minha coluna, quando começo a falar sobre meus contos e personagens, achando que é meio idiota, presunção, sobre algo que nem sei se irá nascer. Mas de repente me vejo espelhado nesse blog, e o que vi é muito bonito!

    como é bom saber a forma que você se locomove nas suas idéias. lindo! bjones!

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