17.8.11

parar de ser brutal

deram uma flor como exemplo. os dentes dos bichos. e vista no minúsculo, flor, era monstrengo de cor microscópicos monstros

"o monstro", disse minha mãe, pra me acalmar, "não existe".

pois bem. a cidade está cinza pela simples razão do tempo. que a terra é um globo imperfeito que gira imperfeitamente. ontem tirei as cartas. depois sonhei com elas. sonhei comigo mesmo. não pude mais e acordei. é inverno. localizamo-nos no hemisfério sul. e há camadas camadas a geologia tomada como exemplo, depois da flor, os fósseis amolecidos no presente,

"a vida, amigo, é a arte do encontro, embora haja tanto desencontro na vida"

a terra gira e você gira junto. quando volta pro mesmo lugar, já não está lá. talvez se num coma, mas mesmo assim, há outros movimentos que a terra faz - e na manhã - de uma volta perfeita - perfeição não há - nem eu, em coma, me encontro comigo.

há uma tribo que não conhece a palavra "eu". para dizer "eu tenho fome" a pessoa diz algo que pode ser traduzido para o português como "você tem fome". todos entendem e comem. há, sim, a primeira pessoa do plural. ela é divida em duas: há uma palavra para o plural inclusivo, em que estamos todos. por exemplo: nós vamos dançar. todos dançam. e há uma palavra que é exclusiva, que exclui a todos. por exemplo: nós vamos dançar. e ninguém dança. porque o resto do mundo já está dançando e nós não existimos separados do resto do mundo, então estamos dançando também, embora não dancemos, propriamente, como dançaríamos em português.

esse povo é muito interessante. logo trago mais informações. utilíssimas para o conhecimento antropológico.

os oceanos cindem. e não só eles. há degraus sobre os pés, e há mais mais adiante. nossa escalada é entre a solidão e o desapego. as árvores aguardam. é delas - ou "do que virá delas" - a terra que eu vou a contragosto alimentar. as árvores carnívoras por via indireta. deixar pra trás toda essa destruição que você traz das outras vidas. "as outras vidas".

as outras vidas.

nenhum porco sabia o seu destino. e comia e engordava e logo era abatido. acasalava, sim, aos olhos das crianças. que riam e às vezes lhes jogavam caroços por cima. os porcos se incomodavam se atingidos nos ouvidos. às vezes distraíam-se; outras, recompostos, retomavam pinto duro de porco na boceta e tudo findo, prazer na lama o gozo envolto nestas tralhas, retornavam à porquice. nasciam mais porquinhos e toda a humanidade pôde comer bacon linguiça costeleta, especiarias, os miúdos para os mais pobres, um prato exótico nos bairros de classe média, meu fígado servido em cubos agridoce eu sou porquinho, como o porco, e assim desde o começo da espécie suína.

ou então os vegetais. ou os bolivianos costurando escravizados no centro de são paulo. evo morales sendo visto e dizem "é muito feio". "ainda bem que você não tem cara de índio". os escravos não bolivianos eram melhor tratados. dormiam no próprio lugar de trabalho e não podiam sair sem autorização, e só em casos extremos. a solidão, o desapego. um apartamento confortável com calefação interna. cidades distantes. olho o mapa na intenção de ajuda. procuro um caminho e não encontro. aviões, trens, rodovias. todos os caminhos possíveis.

iluminação interna. um baralho simbólico e divinatório ao lado. nos primórdios, nas tripas dos animais é que se adivinhava. um fígado de porco traçado e o seu futuro. o futuro é nas entranhas.

[falta]

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